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A guerra total voltou no universo de Warhammer, um conflito que parece não ter fim à vista. Humanos, Dwarfs, Ogres, Halflings, Lizardmen, e muitos outros, lutam ferozmente pelo domínio global. O campo de batalha é proposto pelo novo spinoff de uma das sagas mais lendárias do género de estratégia bélica – Total War: Warhammer III, desenvolvido pela Creative Assembly e publicado pela Sega.

Geralmente habituada às temáticas históricas (como o Japão feudal ou a antiga Roma), a série Total War raramente foge ao realismo. A exceção chegou com as edições Warhammer I e II, de 2016 e 2017 respetivamente, baseadas no clássico jogo de tabuleiro da Games Workshop. Warhammer III promete um final para esta trilogia que mistura o conceito de estratégia 4X com uma boa porção de fantasia e magia. Mas será que está à altura das anteriores?

Análise Total War: Warhammer III

O enorme universo de Warhammer está repleto de lore e também de fãs fieis a esta icónica saga. Talvez inspirados na envergadura do franchise em questão, a Creative Assembly surpreende-nos mesmo antes de começarmos a jogar. Com uns impressionantes 112 gigabytes de espaço necessário para a instalação, não se pode dizer que seja um jogo ‘pequeno’. Com este crescimento nos bytes, Total War: Warhammer III ocupa quase o dobro do espaço do seu antecessor, provavelmente devido a alguns dos importantes upgrades visuais que recebeu.

O grafismo parece agora menos colorido, e os ambientes estão repletos de detalhes extra. Aliado a um esquema de cores mais subtil, esta mistura cria uma atmosfera muito mais sombria, que encaixa aqui na perfeição. Para além disso, foram introduzidas pequenas novas cutscenes, e uma banda sonora harmoniosa que completam a experiência. Mas nem tudo são boas noticias, e com o novo tamanho do jogo, chega também um maior tempo de carregamento, principalmente se for instalado num HDD, em vez dos mais rápidos discos SSD ou os supersónicos SSD M.2.

Estratégia Bem Conhecida

À primeira vista, a jogabilidade base de Total War: Warhammer 3 permaneceu igual. Ainda construímos o nosso império num modo por turnos, movemos exércitos pelo mapa na forma de pequenos peões, ampliamos as cidades que já foram conquistadas com novos edifícios, e mantemos relações diplomáticas com as outras fações. Por outro lado, quando realmente existe uma luta armada, podemos decidir se o computador vai gerar o resultado final, ou se preferimos travar nós próprios a batalha.

Se optarmos pela simulação automática, iremos receber informação detalhada sobre o provável resultado final, algo que não acontecia nos jogos anteriores da série Total War. Para além de uma probabilidade aproximada de vitória, vemos ainda todas as unidades que vamos perder, com base numa informação assinalada a vermelho. Por outro lado, se preferirmos lutar, o jogo muda para o modo em tempo real, tal como já acontecia na série, e passamos a comandar centenas de soldados em simultâneo.

O sistema de unidades também é semelhante ao habitual. Os arqueiros são frágeis e devem ficar na retaguarda, são eficazes contra infantaria, mas vulneráveis a cavalaria. As unidades montadas sofrem mais perdas contra lanceiros, que por sua vez são eles próprios dizimados pela infantaria a curta distancia. Nada de novo até aqui, mas graças ao cenário fantasioso de Warhammer, existem inúmeras criaturas voadoras e demónios enormes, sem mencionar as habilidades mágicas de vários comandantes.

Os comandantes introduzem uma pequena componente RPG ao jogo, uma vez que ganham força com o aumento da experiência de combate, podem usar equipamentos especiais, e aprendem ou melhoram uma nova habilidade de combate a cada nível que sobem. Habitualmente, diz-se que ‘se o sistema funciona, mais vale não alterar’, mas neste caso, estas adições vieram acrescentar ainda mais qualidade.

Estupidez Artificial

Uma das maiores fraquezas de Total War: Warhammer 3 é a IA, que às vezes assume estranhos exageros nas batalhas em tempo real. Enquanto os jogadores normalmente garantem que as suas tropas estejam bem separadas e distribuídas entre os vários oponentes, o computador muitas vezes depende de táticas questionáveis, lançando todas as suas unidades numa só direção e sem qualquer estratégia aparente.

O tempo de reação da IA também é estranhamente lento em algumas situações. Exemplo disso é quando são atacados por arqueiros à distância, só recuando depois das perdas serem demasiado altas. O jogo não tem de ser extremamente difícil, e o NPC pode e deve falhar, mas a sensação de parecer demasiado ‘fácil’ estraga um pouco a experiência de jogo.

Independentemente disso, existem muitas possibilidades e fontes de erro para o jogador, que tornam o jogo mais complexo, e podem levar ao fracasso de toda uma campanha. Podemos ficar sem dinheiro para expandir as cidades, ou ser surpreendidos numa batalha pelo avanço repentino de reforços do inimigo. É aqui que a série Total War destaca-se de alguns concorrentes mais ‘acessíveis’, como Sid Meier’s Civilization ou Age of Empires (turnos e tempo real), isto mesmo nos níveis mais baixos de dificuldade.

As teclas de jogo estão bem explicadas, e as várias ajudas mostram informação relevante. No entanto, falta um guia clássico que possa ser lido de inicio ao fim, e explique resumidamente todo o processo. Talvez para colmatar este problema, a Creative Assembly criou uma extensa campanha de prólogo, especialmente para Total War: Warhammer 3, para ajudar os recém-chegados a compreender grande parte da mecânica do jogo.

Esta campanha centrada apenas no essencial, demora várias horas, e define metas muito específicas que devemos cumprir gradualmente, como conquistar cidades, noções básicas de diplomacia e, claro, controlar o exército em batalha. Bastante útil para os novos jogadores ou para relembrar alguns veteranos.

Reino do Lore

Existem oito raças independentes com as quais podemos jogar a campanha principal, The Realm of Chaos. Cada uma tem as suas características, e como é obvio, todas elas são oriundas do universo Warhammer. A raça Kislev, por exemplo, é levemente inspirada na cultura russa, enquanto os Cathay são parentes distantes dos chineses. Fora das unidades humanas, existem ainda os subordinados dos quatro poderosos deuses do caos Khorne, Nurgle, Tzeentch ou Slaanesh. O conjunto é completo pelos Daemons of Chaos e pelos habitantes dos reinos dos ogres. No entanto, estes últimos fazem parte de um DLC gratuito apenas para quem adquiriu o Total War: Warhammer 3 até ao dia 24 de fevereiro de 2022.

De volta à companha, a história principal está diretamente ligada ao final do prólogo. Yuri Barkov foi enganado pelo príncipe Demónio Be’lakor, manipulado para ferir mortalmente o deus urso Ursun. A partir daqui, temos objetivos diferentes de acordo com qual raça escolhemos jogar. Kislev e Cathay vão preferir salvar Ursun. Já os subordinados dos deuses do caos preferem vê-lo morto para sempre.

Cada raça também tem as suas próprias mecânicas de jogo, que oferecem muita variedade extra. Os Slaanesh são capazes de converter unidades inimigas, enquanto os Tzeentch podem manipular o inimigo forçando uma guerra entre duas facões aliadas.

Algumas raças apresentam ideias realmente inovadoras que exigem repensar completamente a estrutura do exército. O melhor exemplo são os Grand Cathay, que vivem numa relação equilibrada entre as forças do yin e do yang. Em outras palavras: construir prédios, recrutar unidades ou pesquisar uma nova tecnologia, são ações que mudam a bússola na direção do yin ou do yang. Quanto mais equilibrada for esta relação, mais eficientemente o império será. Parece complicado, mas é uma ideia muito interessante e refrescante para a série.

Outra característica única dos Cathay são as caravanas, que podem ser usadas para estabelecer rotas comerciais com os Kislevs. Mas cuidado, porque as caravanas navegam pelo mundo do jogo como unidades independentes e, portanto, estão à mercê de ataques surpresa do inimigo.

Vitória Diplomática

Apesar de toda a complexidade de mecânicas, a Creative Assembly focou-se principalmente no aspeto diplomático, e foi aqui onde mais se expandiu com recursos úteis. Se liderarmos uma aliança militar com outra fação, começamos a colecionar os chamados ‘pontos de solidariedade’. Por sua vez, estes pontos podem ser gastos de várias maneiras, por exemplo, emprestando unidades ao nosso aliado ou pedindo que este nos ajude a defender uma das nossas cidades.

Realmente interessante é montar postos avançados nas cidades aliadas, uma vez que isso desbloqueia o recrutamento das suas unidades para o nosso próprio exercito, criando grupos mistos muito mais poderosos.

Outras inovações diplomáticas estão relacionadas com a troca de cidades ou o comércio rápido, já introduzido em Total War: Three Kingdoms, graças ao qual podemos ver em simultâneo todas as possibilidades de troca disponíveis com todas as fações.

Multijogador

Se preferires jogar com amigos, também é possível fazê-lo na campanha principal online. A este respeito, Total War: Warhammer 3 volta a ser diferente do seu antecessor. Desta vez, até oito jogadores podem competir entre si, mas com uma alteração importante – todos os participantes realizam algumas das suas ações no mapa ao mesmo tempo. Isto oferece um desafio extra à jogabilidade por turnos, atribuindo-lhe um fator de estratégia adicional.

Além disso, existem duas campanhas extra, destinadas principalmente para sessões multijogador. Uma delas, a Creative Assembly projetou especificamente como mini-campanha para uma longa tarde, na qual até três oponentes podem completar uma aventura, sem necessidade de saltar refeições ou noites sem dormir.

Se não tiveres assim tantos amigos disponíveis para jogar, podes competir com a IA, ou adicionar jogadores da Internet. Os veteranos vão conhecer grande parte dos modos de jogo das edições anteriores de Total War, como “Land Battle” ou “Siege”, mas existe agora um novo modo – “Fight for survival”. Aqui teremos de derrotar várias ondas de oponentes, uma após outra, e apenas podemos recrutar mais unidades diretamente no campo de batalha.

Conclusão

A série Total War por vezes surpreende os iniciantes com a sua complexidade. Aqui não basta gerir as tropas em combate para ter sucesso, há muito mais coisas para ter em conta, e isso faz aumentar o risco de falhar em alguma das áreas, uma frustração que não agrada a todos. Por isso mesmo, a Creative Assembly tem feito um esforço para dar uma melhor visão geral de todas as mecânicas importantes do jogo, e em Total War: Warhammer III isso foi conseguido com a extensa campanha de prólogo.

No menos bom, apenas destacamos a IA, que não mostrou estar à altura de um jogador real em certas situações. O novo tamanho de instalação do jogo também pode causar problemas em setups mais modestos. Hoje em dia isso talvez não possa ser apontado como um defeito, e sim mais como uma necessidade técnica, no entanto, pareceu-nos um tamanho algo exagerado para um jogo de estratégia.

O mais completo Total War: Warhammer de sempre, oferece oito raças independentes, algumas delas com mecânicas de jogo realmente inovadoras, e ainda novas opções diplomáticas, que, entre outras novidades, permitem agora uma mistura de unidades de diferentes fações. Uma boa apresentação visual, e uma campanha multijogador para até oito jogadores em simultâneo, completam a lista de novidades que certamente vão agradar aos veteranos da série e inspirar novos jogadores.

[Análise baseada na versão de Total War: Warhammer III para PC, gentilmente cedida pela playandgame.pt]