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A saga Modern Warfare está de volta, nesta que é já a décima sexta edição da extensa família Call of Duty, uma criação dos estúdios da Infinity Ward, publicado pela Activision, que cada vez mais se destaca como uma das mais populares e bem-sucedidas franquias da história dos videojogos. Mas esperem lá! Este não devia ser o quarto COD Modern Warfare? Na verdade, esta edição de 2019 serve como um reboot do arco Modern Warfare, uma aventura que remonta já a 2007 com o lançamento de Call of Duty 4: Modern Warfare para PC, Mac, PlayStation 3, Xbox 360 e Nintendo Wii.

Amplamente elogiado pela critica, o primeiro jogo da subsérie Modern Warfare foi também um importante marco para toda a franquia Call of Duty. Até então, todos os Call of Duty utilizavam como pano de fundo a temática da Segunda Guerra Mundial, mas Modern Warfare trouxe um posicionamento num ambiente de guerra moderna. Tendo resultado num sucesso, esta decisão foi algo arriscada para a produtora, uma vez que a equipa já tinha trabalhado na saga Medal of Honor, e trazia uma enorme experiência num estilo de guerra mais histórico.

Call of Duty: Modern Warfare
Saga original Call of Duty: Modern Warfare. Imagem: DR

Movidos pelo sucesso da nova temática, a Infinity Ward lançou em 2009 a sequela Call of Duty: Modern Warfare 2, um jogo que arrecadou ainda mais elogios do que a primeira aventura, tendo sido um enorme sucesso de vendas. Passadas 24 horas do seu lançamento, o jogo já tinha vendido aproximadamente 4,7 milhões de cópias apenas na América do Norte e Reino Unido. Em 2013, o jogo já tinha vendido 22,7 milhões de cópias. Apesar do enorme sucesso, Call of Duty: Modern Warfare 2 acabou por estar envolvido em alguma polémica, principalmente devido à inclusão de um, agora famoso, nível jogável, onde o jogador participava num ataque terrorista a um aeroporto. Tudo isso foi esquecido com uma nova sequela, Call of Duty: Modern Warfare 3, lançada em 2011, que terminou a história original de Modern Warfare.

Regressados a 2019, encontramos uma nova proposta da Infinity Ward para recontar uma das suas histórias mais populares. Dentro das muitas novidades, o novo Call of Duty: Modern Warfare promete um modo de história muito forte e repleto de conteúdo, novas variantes de jogabilidade multiplayer, operações co-op, e muitas melhorias técnicas, principalmente a nível visual que incluem até compatibilidade com a tecnologia Ray Tracing.

Com tanta coisa nova, será este o melhor Call of Duty dos últimos anos? Pegámos nas armas e viajámos até ao fictício Urzikstão, para descobrir toda a acção e violência de Call of Duty: Modern Warfare, e até momentos onde a moralidade é posta em causa.

Call of Duty: Modern Warfare

Call of Duty: Modern Warfare

Mesmo que Call of Duty: Modern Warfare seja um reboot para a subsérie iniciada em 2007, e muito do plot principal da história ainda seja o mesmo, a verdade é que a Infinity Ward ainda conseguiu introduzir alguns elementos novos. Um destes elementos passa pela localização, que embora se mantenha no Médio Oriente, ocupa agora a região fictícia do Urzikstan, um país algures na região do Cáucaso, onde reside a também fictícia organização terrorista Al-Qatala. Existem também algumas sequências passadas em Londres, e a presença de muitos, mesmo muitos, Russos. Esta mistura aparentemente improvável, mas ao mesmo tempo estranhamente credível, introduz uma campanha repleta de violência e de dilemas, a maioria dos quais infelizmente nem temos fuga ou alternativa.

Grandes Dilemas Morais

Call of Duty: Modern Warfare é mesmo um dos poucos jogos que não demonstra receio em mostrar os terrores da guerra moderna, assim como as consequências que deles podem surgir. Se civis torturados com gás, e vítimas de tiroteios em massa, acabam por tornar-se nos próximos combatentes da resistência, e mais tarde inimigos do mundo ocidental, o mesmo acontece com os soldados que são forçados a utilizar meios que por vezes não parecem justificar os fins. O jogo demonstra claramente a violência, os mortos e o sofrimento de uma zona de guerra, sempre de forma direta, crua e nua, e por vezes até voyeurista, mas também sem falsos moralismos.

Desde cadáveres de crianças junto a parques infantis no Médio Oriente, a civis mortos indiscriminadamente numa embaixada em Londres, os cenários são variados e retratam alguns dos problemas atuais da sociedade moderna. Por vezes, os assassinos estão apenas a poucos metros de distância, e embora possamos vê-los a atuar, nem sempre o nosso personagem tem poder para intervir. A mensagem é, portanto, bastante clara. Ninguém está a salvo da violência.

Call of Duty: Modern Warfare
Call of Duty: Modern Warfare. Imagem: Activision

Perdas de Memória

Quando são abordados temas desta natureza, existem sempre dúvidas de como serão retratados os lados do conflito. Neste caso, a controvérsia envolve diretamente as ações dos soldados russos no jogo, de tal forma que isso despoletou uma onda de revolta juntos dos jogadores daquele país. De facto, o exército russo não é representado de forma muito simpática em Call of Duty: Modern Warfare, recorrendo a gás, morte e tortura, para atingirem os seus objetivos. No entanto, também do outro lado da disputa a ética e a moral flutuam conforme os objetivos. Captain Price, um dos soltados Ingleses presentes no jogo, chega mesmo a referir-se a esta situação, dizendo “Fazemos o trabalho sujo para manter o mundo limpo”.

Acaba por ser credível que um soldado esteja convencido da necessidade das suas ações, que, por vezes, são eticamente mais do que questionáveis, e embora a Infinity Ward não tenha chegado ao passo seguinte, e dar liberdade ao jogador para decidir conforme a sua opinião pessoal, é interessante que tenha introduzido estas sequências.

Ainda assim, existem momentos algo controversos demais para ignorar. Um pequeno spoiler; No oitavo nível da campanha, existe uma referência direta a um acontecimento conhecido como a “Autoestrada da Morte” – Este foi o nome dado a uma tragédia da vida real que ocorreu quando as forças lideradas pelos EUA acabaram por matar dezenas de civis inocentes numa estrada entre o Kuwait e o Iraque, durante a primeira Guerra do Golfo. Em Modern Warfare, o incidente é retratado como uma atrocidade russa, levando muitos a questionar a Infinity Ward. Existem dúvidas se, de facto, isto se trata de uma demonstração de como a mensagem seria “adaptada” para um soldado americano, ou se esta é uma tentativa de passar uma mensagem diferente dos factos reais. Mesmo tratando-se de um videojogo, e de um país fictício, achámos que esta referência devia ter sido omitida ou descrita de forma honesta.

Uma Aventura a Solo

Durante a pequena campanha de cinco a seis horas, um pouco mais curta do que nas entregas anteriores, podemos experimentar ainda mais ação do que antes, com mais emboscadas e missões noturnas. Em algumas situações, temos tempo para apreciar os ambientes e respirar fundo, mas rapidamente tudo pode alterar-se. Quando a violência começa tudo se altera! Os civis correm e fazem piorar a visibilidade, as explosões levantam poeira e pedras, e o barulho ensurdecedor parece retirar-nos a concentração.

Nos melhores momentos do novo Modern Warfare, os fãs da série realmente vão sentir-se em casa, uma vez que a Infinity Ward conseguiu criar alguns dos cenários mais intensos e bem projetados que já vimos, mas infelizmente este nível não acompanha todo o jogo. Algumas das missões parecem recicladas de jogos anteriores, e também nos pareceu existirem tempos de carregamento maiores entre os níveis, provavelmente devido ao número de sequências introdutórias da história, que neste caso estão também muito bem trabalhadas. Depois de tantas edições, não é fácil manter a originalidade, e com as melhorias visuais, está parece-nos uma excelente campanha a solo, ainda que seja tão curta.

Graficamente, Call of Duty: Modern Warfare deu um grande salto para o futuro. Os efeitos de iluminação são muito bons, algo ainda mais explorado nas novas e variadas missões de visão noturna. Ao mesmo tempo, convence também com os modelos de personagens, texturas de pisos e paredes, assim como as armas meticulosamente projetadas, que parecem realistas até numa PS4 a “apenas” 1080p.

Call of Duty: Modern Warfare
Call of Duty: Modern Warfare. Imagem: Activision

Online para Todos os Gostos

A base do modo online continua a ser a mesma. Existem rankings, classes de armas e subidas de nível que desbloqueiam novas armas. No entanto, foram adicionadas novas variantes de jogo, e algumas são de facto interessantes para estilos de jogadores diferentes, que queiram ir para além dos típicos Deathmatch, Domination e Search & Destroy.

Uma das novidades passa pelos novos modos online que permitem um número maior de jogadores num único mapa, especialmente evidente no novo modo chamado Ground War, que permite até 64 jogadores em simultâneo. Outro novo modo é o Gunfight, onde duas equipas de dois jogadores se enfrentam em pequenas partidas de 40 segundos por ronda. A variedade nunca é demais, e torna-se interessante podermos trocar de estilo de jogo tão rapidamente.

A jogabilidade do modo multiplayer também foi reformulada para permitir um estilo mais tático, incluindo um foco na exploração do mapa, abertura de portas e um modo de “Realismo” que remove o HUD. As Killstreaks também voltaram (recompensas com base em mortes), e podem ser convertidas em Scorestreaks com o uso de um benefício no jogo chamado de Pointman.

Call of Duty: Modern Warfare inclui ainda um extenso sistema de personalização de armas, apresentando, a maioria, até 60 acessórios para escolher (cinco dos quais podem ser equipados a qualquer momento). A introdução no início das partidas multiplayer também foi reformulada. Enquanto nos títulos anteriores os jogadores permaneciam imóveis no mapa até o cronómetro atingir o zero, no novo jogo, os jogadores serão transportados para a zona de batalha como parte de várias animações, uma novidade puramente estética, mas que não deixa de ser interessante.

Modern Warfare é o primeiro jogo da série desde 2013 (Call of Duty: Ghosts) a não incluir o modo Zombie, apresentando, em vez disso, o modo cooperativo Special Ops, já anteriormente presente em Call of Duty: Modern Warfare 2 e Call of Duty: Modern Warfare 3.

O Spec Ops partilha a sua narrativa com a campanha e o próprio modo multiplayer, e inclui ainda um modo Survival, que é exclusivo do lançamento para PlayStation 4, até outubro de 2020. A esta altura da nossa análise, este modo Special Ops apresenta quatro Operações, que são missões de múltiplos objetivos que ocorrem num grande mapa aberto, e exigem que quatro jogadores partilhem a experiência. Como amantes de modos co-op, esta foi um readição que recebemos de bom grado. É esperado que no futuro venham a ser disponibilizados DLCs com novas missões.

As famosas microtransações, para ganhar mais XP, armas mais poderosas, ou lootboxes, não existem em Modern Warfare. À data de lançamento, o que existe é o pack defender, que, por cerca de 10 €, oferece algumas skins, e onde parte do valor reverte para os veteranos de guerra dos EUA e Reino Unido. É previsível que venham a aparecer DLCs, ou outro tipo de atualizações pagas, mas para já nada foi anunciado.

Call of Duty: Modern Warfare
Call of Duty: Modern Warfare. Imagem: Activision

Crossplay

Um dos destaques do novo Call of Duty: Modern Warfare é a possibilidade de jogarmos em conjunto com jogadores de diferentes plataformas, em todas as variantes multiplayer e cooperativas, graças a uma função conhecida por crossplay. O jogo indica, além da plataforma, se os outros jogadores utilizam comando ou a combinação rato e teclado.

Para o modo Ground War, somos obrigados a ativar a opção de crossplay, enquanto nas restantes variantes podemos decidir se preferimos jogar com jogadores que utilizem a mesma plataforma (crossplay desligado), ou estamos disponíveis para interagir com jogadores em qualquer plataforma (crossplay ativo). Na PS4, a pesquisa e o desempenho dos jogos funcionaram perfeitamente durante todas as partidas multijogador, mas nos modos cooperativos, existem alguns carregamentos tardios de texturas e interrupções de jogo. De qualquer forma, mesmo ainda não sendo perfeito, achámos muito positiva esta aposta da Infinity Ward numa jogabilidade multiplataforma.

Veredito

O novo Call of Duty: Modern Warfare de 2019 marca o regresso da Infinity Ward a uma época na qual foi muito feliz. Servindo como o reboot da história iniciada em 2007, o novo Call of Duty: Modern Warfare não parece surpreender se compararmos com aquilo que definiu a sua edição original. O jogo de 2007 foi um dos mais populares jogos da saga, juntamente com a sua sequela lançada em 2009. Com isto, não estamos a dizer que este lançamento será um flop. Não conseguimos dizer que se trata de um marco, mas também não será uma desilusão. Se juntarmos a uma história de sucesso comprovado, a utilização das tecnologias gráficas mais recentes e mais conteúdo do que nunca, até podemos arriscar dizer que este é o melhor Call of Duty dos últimos anos.

Com um sistema de tiro irrepreensível, excelente grafismo e um divertido modo multiplayer, desta vez mais diversificado do que nunca, Call of Duty: Modern Warfare parece ter, à primeira vista, tudo o que um shooter deve oferecer. O seu maior problema chega exatamente naquele que foi um dos focos da saga até agora, o modo campanha! Embora continue a ser direto e violento quanto baste, não demonstra a mesma emoção que antes, ou talvez já não inove o suficiente para nos impressionar. Uma narrativa não linear, que oferecesse opções aos jogadores, e diálogos um pouco mais trabalhados, teriam tornado esta experiência bem mais completa. As “falhas de memória”, ou a “incoerência histórica” também não ajudam.

Obviamente apreciámos a campanha intensa e profunda de Modern Warfare, apoiada por um cenário gráfico significativamente melhorado, e alguns dos melhores designs de missões até ao momento. No entanto, uma segunda metade do jogo mais fraca, e a muito curta duração da campanha, impediram que fosse brilhante. Felizmente, o pacote multiplayer, enormemente extenso, destaca-se de forma positiva. Com um estilo de jogo direto, desafiador, e os seus novos modos e variantes de jogo, Call of Duty: Modern Warfare continua a ser um título a não perder, principalmente para os fãs de longa data da saga, e para todos os amantes de ação de tiro na primeira pessoa.

Esta análise foi baseada numa versão para PlayStation 4.